sexta-feira, 3 de julho de 2009

Riso

Riso

Sitônio Pinto

Por muitos e bons anos Riso foi agente de arte em Paris, expondo e promovendo artistas plásticos brasileiros, locais e do mundo inteiro que a procuravam para entrar no mundo das artes, da fama e da glória. Foi uma espécie de embaixadora brasileira em Paris, dizia seu amigo Palmary Lucena, ele também uma espécie de embaixador brasileiro junto a tantos organismos internacionais em que trabalhou, agora publicando sua experiência de globe-trotter em insuperáveis artigos que promete transformar em livro.
Riso era filha do emérito professor Raul Córdula e de Dona Elizabete Trevas Córdula, ele meu mestre de Latim no curso Clássico do Lyceu, lá no começo dos anos sessentas. Naquele tempo, tudo que se fazia no setor de educação, na Paraíba, tinha de passar sob o crivo do professor Raul Córdula, mestre não só em Latim, mas ainda em Pedagogia. Era um homem literalmente esperto e ativo: viveu acordado durante muitos anos, absolutamente sem dormir. Uma noite, alta noite, em meio de uma farra, passei por sua casa e vi a luz acesa. Não me lembrei do detalhe da insônia do professor; pulei o muro e chamei por Raul (o Córdula Filho), meu colega do Liceu e do grupo dos “Párias” – ambiente que envolvia a Geração 59.
- Quem é?
- É Dom Quixote, Pária!
Ao ouvir a expressão “Pária”, o mestre entendeu que o chamado não era para ele, e, um tanto perplexo, foi acordar o filho:
- Raulzinho, tem uma cara aí chamando por você, dizendo que é Dom Quixote.
Riso era a irmã mais velha do meu irmão Raul, o pintor de “A vendedora de flores” e da série “Borborema”, premiado internacionalmente. A irmã mais velha de Leda, de quem falei há poucos dias, nessa coluna, como a ganhadora do prêmio de melhor atriz no Festival Nacional de Teatros de Estudantes, realizado em Santos, SP, nos idos de 1959. Era a irmã mais velha de Betinha Kawamura; a irmã mais velha de Roberto e de tantos nós, principalmente daqueles que foram buscar seu apoio para entrar no mundo das artes de Paris – onde tinha um círculo mágico de amizades, em que se destacava o escritor Paulo Coelho.
Durante muitos anos, Riso lutou bravamente contra o lobo do câncer. Sua luta desigual contra o inimigo feroz faz lembrar a passagem de Paulo Coelho em “O Demônio e a Srta. Prim”:
- Agora mostre que é um homem – gritou. – Desça da árvore, segure firme o archote, e mantenha o fogo na direção do lobo!
[...] O lobo recuara, estava assustado com o fogo: continuava a rosnar e saltar, mas não chegava perto.
Riso era uma espécie de irmã mais velha de sua geração. De Palmary Lucena a Glória Gadelha, dos artistas brasileiros que precisavam de um referencial na França. E deixou-nos uma irmã belíssima – sua filha Cristina Córdula -, a grande manequim brasileira internacional, capa das revistas do mundo, que abriu caminho para as estrelas de hoje e que ainda brilha sob o céu de Paris.