sexta-feira, 3 de julho de 2009

Aqueles atos secretos

Aqueles atos secretos

Sitônio Pinto

Durante a recente e indecente ditadura militar, inventaram um dispositivo legal chamado “decreto secreto”, que podia ser baixado a qualquer hora do dia ou da noite pelo gorila de plantão na presidência da República. Isso sem que ninguém visse ou soubesse, ou dele tomasse conhecimento mesmo por ouvir dizer. Um abuso que contraria um princípio universal e fundamental do Direito: o princípio da publicidade. Reza a Constituição Brasileira que a ninguém é dado alegar ignorância da lei. Como é que o cidadão pode obedecer ou transgredir a um decreto secreto, se ele não sabe do que trata?
Esse e outros vícios da ditadura foram herdados pelas instituições brasileiras, mesmo após a promulgação da Constituição de 1988, efeméride em que muitos vêem o fim da ditadura iniciada em 1964, que tanto infelicitou o povo brasileiro - e até outros povos, pois influenciou e estimulou os gorilas dos países vizinhos a deflagrar seus golpes. Naqueles tempos, a América do Sul era o continente do sistema solar em que havia mais gorilas por metro quadrado.
Um dos vícios herdados pelos nostálgicos da ditadura milicar veio à tona recentemente: os “atos secretos” do Senado, perpetrados a mancheias pela diretoria daquele parlamento burguês. São milhares, dezenas de milhares, cometidos nos últimos anos. Anuncia-se que será realizada uma auditoria pelo Ministério Público, o Tribunal de Contas da União e, a se confirmar, a Fundação Getúlio Vargas. Torçamos para que tudo não se transforme numa enorme pizza. A princípio, quiseram negar o escândalo. Mas a seboseira veio à tona, como os corpos passageiros do Airbus. Agora, é recolher os destroços do sinistro.
Que vergonha, hein? Logo no parlamento sênior. O vício vem de longe, envolvendo outros mandatos, outras diretorias da casa-grande do Brasil. Só admitiram a maracutaia quando não se podia mais esconder o malfeito. Nomearam uma multidão de apaniguados para ganhar salários marajás na moleza, sem trabalhar. Tinha gente morando no exterior ganhando o dinheiro pago com o tributo do povo, o imposto arrancado às tripas dos pobres.
Outra casa legiferante que está a precisar de uma devassa é a Assembléia Legislativa da Paraíba. Há suspeitas de que aquela casa alberga cerca de 50 mil funcionários, grande parte dos quais nomeados por meio de atos mais ou menos secretos, sem publicidade, bastando ao apaniguado apresentar apenas uma conta bancária, para onde vai o salário do marajá. E o vício vem de longe, de velhos e bons tempos, como no Senado. Denunciei isso ao Ministério Público do Trabalho, que repassou a incumbência da investigação para o Ministério Público Estadual, que abriu Ação Civil Pública. Mas é muita areia para o caminhão do MP do Estado. Devassa como essa tem de ser feita pela autoridade federal, com a PF e auditores federais.
Agora, um naipe deputados está aplicando todo o rigor na análise de uma proposta de empréstimo que o Executivo pleiteou junto ao BNDES, proposta já aprovada pelo banco. Os mesmos deputados que aprovaram dúzia e meia de mensagens do governo anterior em apenas um expediente, o que me fez mover uma Ação Popular contra o escandaloso espalhafato, junto com o comunista Simão Almeida, ex-presidente do PCdoB e ex-participante da guerrilha do Araguaia, e o irmão Lúcio Flávio, ex-grão-mestre da maçonaria. Uma frente ampla contra a corrupção.